CVM julga primeiro caso brasileiro de spoofing

08 Maio 2018

O colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) julgou o primeiro caso brasileiro envolvendo a prática de spoofing, em 13 de março de 2018[1]. O processo teve origem em informações encaminhadas pela BM&FBovespa Supervisão de Mercados – BSM, a partir das investigações realizadas no âmbito do Procedimento Administrativo Ordinário n.º 05/2016, encerrado por meio de termo de compromisso de 31 de maio de 2016.

 

A prática de spoofing corresponde ao registro de oferta de compra ou de venda de um determinado valor mobiliário (negócio efetivamente pretendido pelo agente), acompanhado do subsequente registro de oferta sobre lote expressivo do mesmo valor mobiliário, do lado oposto do livro de ofertas (ordem artificial, colocada para influenciar a formação de preço do ativo), que perdura por curto período de tempo e é cancelada imediatamente após a concretização do primeiro negócio[2].

 

Seus elementos – ou seja, a colocação de ordens de compra e venda em ambos os lados do livro de ofertas de um mesmo ativo; o registro de ofertas expressivas; e o cancelamento de ordens colocadas depois de curto intervalo de permanência –, se considerados individualmente, não são irregulares.

 

A estratégia, no entanto, tem por objetivo alterar a formação do preço do ativo negociado e influenciar a decisão de terceiros a comprar ou vender o ativo a determinado preço, fazendo com que o negócio pretendido pelo agente seja realizado em condições que lhe são mais favoráveis: caso pretenda comprar o ativo, a preços mais baixos (incentivados pela colocação de ordens artificiais de venda); ou, caso pretenda vender o ativo, a preços mais altos (incentivados pela colocação de ordens artificiais de compra).

 

Em razão de sua finalidade, a estratégia de spoofing foi considerada irregular e uma forma de manipulação de mercado, ainda que seus elementos sejam, individualmente, lícitos. Por estar diretamente relacionada à formação do preço do ativo negociado, a prática foi enquadrada pela CVM no tipo administrativo de manipulação de preços, uma das espécies de manipulação de mercado previstas na regulação (inciso II, “b” da ICVM 08/1979[3]).

 

Nesse aspecto, a CVM divergiu do posicionamento da BSM, que havia enquadrado a estratégia em outra das espécies de manipulação de mercado: a criação de condições artificiais de oferta ou demanda (inciso II, “a” da ICVM 08/1979[4]), embora tenha registrado que as duas espécies de manipulação de mercado em questão (manipulação de preços e criação de condições artificiais de oferta ou demanda) são congêneres e têm por objetivo a proteção do mesmo bem jurídico: a integridade do mercado de valores mobiliários.

 

Os critérios considerados pela CVM para caracterização da prática de spoofing, por outro lado, foram aqueles originalmente propostos pela BSM. São eles: (i) a existência de oferta no lado oposto do livro até o 5º nível de preço, no momento da execução do negócio; (ii) a colocação de oferta pelo menos 1,8 vezes maior que a soma de todas as demais ofertas do mesmo lado do livro, até o 3º nível de preço; (iii) a colocação de oferta 6 vezes maior que o tamanho médio praticado no mercado nos 3 pregões anteriores ao negócio; e, cumulativamente, (iv) a permanência da oferta no livro de ofertas do ativo por menos de 10 segundos. A CVM registrou, ainda, que a prática de spoofing é uma infração de mera conduta, não sendo necessária, portanto, a existência de um prejuízo ou benefício aos envolvidos para a caracterização da irregularidade.

 

Verificados os critérios descritos acima, a CVM condenou os investigados ao pagamento de multa pecuniária equivalente ao dobro do benefício por eles auferido, correspondente ao spread entre o preço das melhores ofertas dos valores mobiliários negociados anterior e depois da realização das práticas de spoofing. Da decisão da CVM cabe recurso voluntário ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN).

 


 

[1] Processo administrativo sancionador n.º 19957.005977/2016-18, Rel. Dir. Henrique Balduíno Machado Moreira, j. 13.03.2018, v.u..

 

[2] Foi apresentada a definição usada no âmbito do processo administrativo julgado pela CVM, embora o termo possa ter definição menos estrita.

 

[3]ICVM 08/1979. II – Para os efeitos desta Instrução conceitua-se como: (…) b) manipulação de preços no mercado de valores mobiliários, a utilização de qualquer processo ou artifício destinado, direta ou indiretamente, a elevar, manter ou baixar a cotação de um valor mobiliário, induzindo, terceiros à sua compra e venda”.

 

[4]ICVM 08/1979. II – Para os efeitos desta Instrução conceitua-se como: (…) a) condições artificiais de demanda, oferta ou preço de valores mobiliários aquelas criadas em decorrência de negociações pelas quais seus participantes ou intermediários, por ação ou omissão dolosa provocarem, direta ou indiretamente, alterações no fluxo de ordens de compra ou venda de valores mobiliários”.

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