CRSFN reverte decisão da CVM sobre conflito de interesses da União Federal

20 Setembro 2017

Em 26 de maio de 2015, o Colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) decidiu, por unanimidade, aplicar multa de R$ 500 mil à União Federal, por ter votado favoravelmente à renovação dos contratos de concessão de distribuição e transmissão de energia elétrica celebrados entre a União Federal e sociedades concessionárias controladas pela Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras), na assembleia geral extraordinária da companhia realizada em 03 de dezembro de 2012[1].

 

Uma vez aprovada a matéria pela assembleia geral da Eletrobras, os referidos contratos de concessão, com vencimento até 2017, foram renovados sob o regime jurídico recém-instituído pela Medida Provisória n.º 579/2012 (posteriormente convertida na Lei n.º 12.783/2013).

 

Um dos efeitos da renovação dos contratos de concessão seria a renúncia, pelas concessionárias, a quaisquer eventuais direitos preexistentes à edição da Medida Provisória n.º 579/2012 que pudessem contrariar suas disposições. A renúncia, nesses termos, abarcaria o direito das concessionárias de eventualmente questionar judicialmente a constitucionalidade da medida provisória, em especial quanto à sua aplicabilidade a concessões anteriores à sua edição, bem como à forma de cálculo das indenizações devidas pela União Federal por ativos não amortizados pelas concessionárias de energia.

 

A própria Eletrobras, anteriormente à realização da assembleia geral em questão, elaborou um parecer interno a respeito dos efeitos da referida renúncia, datado de 08 de novembro de 2012. De acordo com o parecer, a forma de cálculo prevista na Medida Provisória n.º 579/2012 não poderia alcançar as relações jurídicas existentes entre as concessionárias controladas pela Eletrobras e a União Federal que tivessem sido constituídas anteriormente à edição da medida provisória, sob pena de sua inconstitucionalidade. No entanto, se os contratos de concessão fossem renovados, o direito de questionar essa aplicação, bem como a forma de cálculo da indenização prevista na Medida Provisória n.º 579/2012, seria consequentemente renunciado pelas concessionárias de energia.

 

A União Federal, nesse contexto, na qualidade de acionista controladora da Eletrobras, compareceu à referida assembleia geral extraordinária da companhia e votou favoravelmente à renovação dos contratos de concessão de energia elétrica.

 

Diante de sua manifestação de voto pela renovação dos contratos de concessão, a Superintendência de Relações com Empresas (SEP) instaurou processo administrativo sancionador em face da União Federal, por violação ao disposto no artigo 115, §1º, da Lei das Sociedades por Ações, que veda o voto de acionistas em situação de conflito de interesses. O termo de acusação não contemplou eventual configuração de abuso de poder de controle por parte da União Federal, ao contrário do requerido por acionista minoritário da companhia que se manifestou no processo.

 

O colegiado da CVM concluiu que o voto da União Federal na assembleia geral da Eletrobras teria sido proferido em situação de conflito de interesses, uma vez que a União Federal teria um interesse externo (extra-societário) na renúncia, pelas concessionárias de energia, ao direito de questionar judicialmente a aplicabilidade da Medida Provisória n.º 579/2012 e o valor devido a título de indenização, decorrente da renovação dos contratos de concessão. O colegiado da CVM decidiu, assim, que, ao se manifestar na referida deliberação assemblear, a União Federal teria violado a proibição legal ao exercício do voto em situações de conflito de interesses, conforme previsto no artigo 115, §1º, da Lei das Sociedades por Ações, aplicando-lhe a multa de R$ 500 mil em razão da infração.

 

A União Federal recorreu da decisão do colegiado da CVM e submeteu a controvérsia à apreciação do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN)[2].

 

Os votos dos conselheiros do CRSFN que se manifestaram no processo resultaram em empate – foram proferidos 4 votos favoráveis à absolvição da União Federal e 4 votos favoráveis à manutenção da decisão do colegiado da CVM[3] –, o qual foi solucionado pelo voto de qualidade do relator do processo, conselheiro Flávio Maia Fernandes dos Santos. Prevaleceu, então, a decisão pela total improcedência da acusação e absolvição da União Federal, mediante a reversão da decisão do colegiado da CVM.

 

A decisão do CRSFN decorreu, em termos gerais, do entendimento de que, considerando que o artigo 238, da Lei das Sociedades por Ações, permite que o controlador estatal oriente as atividades da empresa estatal de forma a atender o interesse público (interesse primário) que justificou sua criação, a União Federal não estaria impedida de votar na assembleia geral extraordinária da Eletrobras em questão. Nesse sentido, a deliberação sobre a renovação dos contratos de concessão de energia elétrica das controladas da companhia estaria em linha com o interesse público primário que justificou a criação da Eletrobras, nos termos do voto do conselheiro relator.

 

Deve-se ressaltar, em todo o caso, que os conselheiros do CRSFN manifestaram opiniões bastante diversas sobre o caso, inclusive quanto aos fundamentos levantados por cada um deles para justificar suas posições, em suas respectivas declarações de voto.

 

Imediatamente após a decisão do CRSFN, em 28 de junho de 2017, a CVM reafirmou, por meio do comunicado ao mercado n.º 07/2017, o posicionamento do colegiado da autarquia manifestado por ocasião do julgamento do caso Eletrobras, declarando, na mesma oportunidade, de todo modo, que respeita a instância decisória do CRSFN e o resultado do julgamento do recurso.

 


 

[1] Processo administrativo sancionador CVM RJ 2013/6635, Rel. Dir. Luciana Dias, j. 26.05.2015.

 

[2] Recurso n.º 14.306, processo n.º 10372.000246/2016-82, rel. Cons. Flávio Maia Fernandes dos Santos, j. 28.07.2017.

 

[3] O CRSFN é formado por 9 conselheiros, mas a conselheira Adriana Cristina Dullius se deu por impedida e não se manifestou neste caso. Votaram favoravelmente à absolvição da União Federal os conselheiros (i) Flávio Maia Fernandes dos Santos; (ii) Sérgio Cipriano dos Santos; (iii) Antonio Augusto de Sá Freire Filho; e (iv) Ana Maria Melo Netto Oliveira. Votaram pela manutenção da decisão da CVM os conselheiros (i) Alexandre Henrique Graziano; (ii) Carlos Pagano Botana Portugal Gouvêa; (iii) Otto Eduardo Fonseca de Albuquerque Lobo; e (iv) Thiago Paiva Chaves.

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